28/09/1991 - A ÚLTIMA NOTA DE MILES DAVIS

 

 
Miles Dewey Davis III, mais conhecido como MILES DAVIS no meio musical e entre seus fiéis fãs, nascido em 26 de maio de 1926 em Alton, Illinois, Estados Unidos, e falecido aos 28 de setembro de 1991, em Santa Monica, Califórnia, Estados Unidos, por uma doença genética chamada drepanocitose que lhe causou complicações principalmente em seus pulmões, levando-o à morte aos 41 anos. Nesta data de hoje se completam 33 anos desde sua morte, o fim de uma lenda da música e de um dos grandes revolucionários musicais ao lado de Muddy Waters, Cream, Jimi Hendrix, Beatles, Black Sabbath, Kraftwerk, Depeche Mode, New Order, Van Halen, Slayer, Nirvana e Rammstein, por exemplo, mas pouco lembrado por estar mais restrito ao Jazz, o que é injusto, pois ele fundiu a este estilo influências de rock e funk na década de 1970 em seu majestoso álbum chamado BITCHES BREW, o meu preferido. Espero que os músicos atuais o redescubram e o tragam para próximo e assim os influencie, pois a música atual carece dessas influências inspiradoras para criar músicos de competência e trazer a virtuosidade novamente ao mundo da música, pois os estilos musicais, de uma forma geral, estão cada vez mais pobres e simplistas, musicalmente falando.
 
Filho de uma tecladista e violinista de renome que se vestia de casacos de pele e diamantes, fonte declarada de sua inspiração estilística, Miles cresceu na seção leste de St. Louis, Illinois, um local de alguns dos maiores e mais violentos "motins raciais" dos Estados Unidos, entre os vários já ocorridos no país desde o fim da escravatura. Ao ver e ouvir Charlie Parker e Dizzy Gillespie tocando em St. Louis como integrantes da banda de Billy Eckstine, Miles ouviu o jazz moderno pela primeira vez e isso mudou sua vida. Convenceu sua família a mandá-lo a Nova York e estudar música clássica na prestigiada escola Julliard, em setembro de 1944, participando das aulas durante o dia e pela noite seguia desenvolvendo suas habilidades de improvisação nos clubes de jazz. Ninguém menos que Charlie Parker como seu guru musical e companheiro de quarto. Nessa época, Miles manteve-se fora das drogas sabendo no efeito negativo que causaria em seus estudos e práticas.

Dois de seus discos que mudaram a música, nesse estágio inicial, foram os aclamados Birth of the Cool e Walkin', ambos lançados em 1957, migrando do Cool Jazz ao novo estilo batizado de Hard Bop, mais galgado no Blues, um dos movimentos de jazz mais importantes dos anos 1950 e início da década de 1960. Em 1955, Davis contava com ninguém menos que o jovem John Coltrane em seu quinteto e encerraram as gravações com o selo Prestige, mudando para a Columbia onde estrearam com nada menos que  ‘Round About Midnight. Nas ondas do novo estilo chamado Free Jazz (uma espécie de poemas escritos em versos livres), em meados dos anos 1960, Miles reforma seu quinteto e conta com músicos do naipe de  Wayne Shorter, Herbie Hancock, Tony Williams e o baixista Ron Carter, revolucionando a música em estruturas tradicionais e um pulso rítmico regular tratados com uma plasticidade absurda. Sua grande e maior revolução musical aconteceu no final da década de 1960 devido ao florescimento do rock psicodélico e do funk, alinhavando um novo som baseado nas amizades com Jimi Hendrix e Sly Stone, principalmente, além de outras estrelas do rock que renderam a Davis o desejo de formar "a banda de rock mais malvada do mundo." Sua fase jazz-rock chegou de mansinho com os múltiplos teclados  e texturas flutuantes de "In a Silent Way", mas a ajuda de novos recrutas, como o guitarrista John McLaughlin e o percussionista brasileiro, Airto Moreira, mudou-se para climas musicais mais acachapantes com os discos BITCHES BREW e JACK JOHNSON. Os críticos de jazz tradicional que já o detestavam, quase tiveram uma síncope com o ataque sônico total da banda elétrica de Davis em meados dos anos 1970 e o uso de guitarras elétricas, percussão pesada, música indiana, algo muito parecido com o que Hendrix causou no mundo do rock ao trazer o Jazz e outros elementos como o pedal de distorção e o wha-wha para sua guitarra aterrorizar os ouvidos mais conservadores e criar uma nova mentalidade musical. É muita revolução a base de muito barulho, novos tempos chegavam.

Como se todo o barulho causado fosse pouco, Miles chegou ao absurdo de colocar dois e às vezes três guitarristas elétricos em estúdio para os discos Agharta, Pangea e Dark Magus ultrapassaram o público de jazz, ligando-se com a vanguarda do punk e pós-punk rock, sendo o álbum mais extremo destes três o Dark Magus que, não se sabe como a Columbia permitiu tal feito, permanece ainda inédito nos EUA, um descuido inexplicável, adquiridos somente como uma importação japonesa que chegou às mãos de roqueiros influentes como o guitarrista Robert Quine (que tocou com Richard Hell e Lou Reed) e o pioneiro do punk-funk James Chance and the Contortions. Miles tinha lançado o Jazz a esferas jamais antes previstas, atingindo diferentes ouvintes de uma maneira explosiva e altamente caótica no início e em meados dos anos 1970 com o agressivo e fresco toque do punk, da New Wave, do Rock Industrial e bandas contemporâneas que se utilizam da guitarra  como o Sonic Youth, por exemplo, e os ouvintes que o descobriram nos discos dos anos 1980, como We Want Miles, Tutu ou Siesta, fizeram dessas gravações tão importantes, mesmo cruciais para mantê-lo ainda relevante no sempre mutante mundo da música. Miles é sinônimo de vanguarda musical.

Um fato curioso, uma fofoca do mundo musical. No ano de 1969, Jimi Hendrix em apresentação no renomado Fillmore East, em Nova York, no auge da sua carreira, com seu jeito único de tocar guitarra, cantando e compondo à todo vapor, no auge de sua forma e prestígio, Hendrix se aproximava do fim da vida e, de acordo com o site CheatSheet, o artista batia cabeça para achar um produtor que convertesse o que estava em sua  cabeça em gravações completas entre 1969 e 1970, o ano da morte dele e uma das pessoas com quem ele tinha planos de se encontrar era Miles Davis, lenda do jazz, e a dupla já tinha um horário marcado no estúdio para pôr em prática as jam sessions ensaiadas na casa de Miles que já tinha montado a banda, sendo Tony Williams na bateria, como explicou Douglas no livro Hendrix: Setting the Record Straight (1992). Os quatro envolvidos no projeto combinaram de dividir os royalties igualmente. Na então hora marcada no estúdio Hit Factory, de Nova York. Chegando 30 minutos antes do início dos trabalhos, Douglas atende uma ligação do empresário de Davis exigindo US$ 50 mil antes da gravação. Ambos Hendrix e Douglas declinaram o pedido, Davis desistiu e o projeto foi engavetado, recebendo um sonoro "F*da-se," de Hendrix logo após o término da ligação, nas palavras de Douglas. Ambos ainda tinham um encontro marcado para o final do mês de setembro de 1970 no Carnegie Hall, ensaiaando para o possível álbum ao vivo e sua futura edição, mas com a morte de Jimi, invitavelmente o projeto foi arquivado e Miles esteve presente nos funerais de Hendrix, onde tentou em vão tocar seu trumpete, mas foi impedido por Leon, irmão do guitarrista.

Nas palavras do próprio Davis: "Ele e eu devíamos nos encontrar em Londres depois do Concerto na Ilha de Wight para discutir um disco que finalmente decidimos fazer juntos. Quase fizemos um certa vez, com o produtor Alan Douglas, mas ou não pagavam bastante ou estávamos ocupados demais para fazê-lo juntos. Tínhamos tocado muito juntos na minha casa, apenas fazendo jams, e achávamos que talvez tivesse chegado a hora de fazermos alguma coisa juntos num álbum. Mas as estradas estavam tão engarrafadas na volta a Londres, após este concerto, que não consegui chegar a tempo, e quando cheguei a Londres Jimi não estava mais lá. Eu ia para a França, acho, fazer mais algumas apresentações e depois voltaria à Nova York. Gil Evans me ligou e disse que ia se encontrar com Jimi e queria que eu participasse do encontro. Respondi que iria. Esperávamos a chegada de Jimi quando soubemos que ele tinha morrido em Londres".

Em 1975, logo após gravar esses discos ao vivo, Davis se aposentou por cinco anos para cuidar de sua saúde, pois estava sofrendo de problemas recorrentes, como lesões no quadril e nas pernas, provocando dores quase constantes que, em sua autobiografia, foi descrito como um momento "quase tão sombrio quanto aquele de que eu tinha me tirado quando era um viciado", fazendo uma observação que “sexo e drogas ocuparam o lugar que a música ocupava em minha vida até então e eu fazia os dois o tempo todo." Embora seus amigos duvidassem que ele tocasse novamente, em 1980 gravou um álbum de retorno chamado "The Man With the Horn". Apesar de tudo, Miles se manteve em turnê e sua desgastante agenda de apresentações, contudo, bem no início de setembro de 1991 ele deu entrada no Hospital e Centro de Saúde St. John, em Santa Monica, Califórnia (EUA), vindo a óbito após sofrer de pneumonia, insuficiência respiratória e um derrame. 

De Miles, leiamos o testamento escrito mais honesto e estimulante que um músico norte-americano de seu quilate poderia deixar àqueles que ainda não tinham o espírito da música em seu estado mais puro: “O mundo sempre foi baseado em mudança. Pessoas que não mudam se verão como músicos folk, tocando em museus como filhos da p***. Porque a música e o som se internacionalizaram e não faz sentido tentar voltar para o útero onde você estava. Um homem não pode voltar para o ventre de sua mãe."

 

Fontes:

Miles Davis: 30 anos da morte do homem que mudou a música - Robert Palmer | Rolling Stone EUA. (https://rollingstone.com.br/musica/miles-davis-30-anos-da-morte-do-homem-que-mudou-musica/)

Por que a colaboração entre Jimi Hendrix e Miles Davis em 1969 deu errado? - Marina Sakai | @marinasakai (https://rollingstone.com.br/noticia/por-que-colaboracao-entre-jimi-hendrix-e-miles-davis-em-1969-deu-errado/)

O encontro entre Miles Davis e Jimi Hendrix - Por Vagner Pitta, Colecionador, Exoticpittajazz
(https://www.collectorsroom.com.br/2009/04/o-encontro-entre-miles-davis-e-jimi.html)

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